A ilusão do “não tenho tempo”
por António Pimenta de Brito
Quantas vezes dizemos, “gostava tanto, mas não tenho tempo”. Umas vezes com pena, outras temos de confessar, é a desculpa habitual para quem se quer esquivar. Pode ser o ter mais tempo para estar com a família, guardar uma meia hora para ler, uma hora de ginásio, estar com aquele grupo de pessoas que nos faz bem. A nossa vida, ainda para mais a contemporânea, não perdoa. É verdade que a quantidade de exigências e complexidade nunca foi tanta, mesmo que a tecnologia a facilite.
Estamos em todo o lado rapidamente, mas também queremos os trabalhos bem remunerados, a casa ideal, filhos bem-educados, corpos perfeitos, objetivos comerciais ultrapassados, WhatsApps até às 00h, grupos de networking pois não chega as relações do trabalho para progredir, lida da casa, formação, amigos e depois esgotados, não conseguimos chegar a tudo.
Mas até queríamos mudar e dizemos, “Gostava de ler mais”, “Tenho de estar mais com a minha mulher”, “Tenho de rezar mais”. “Quero conhecer mais pessoas”. Mesmo sem sabermos porquê, o resultado é sabido, não vamos fazer nada disso. Então, mas não é bom querer? Claro que sim. Não somos pessoas que desejem coisas más a toda a hora, mas se apenas “queremos”, não chega.
A pergunta correta é “gostavas de estar mais com os teus filhos? Mas quanto? 30m? 1h? levar à escola?” Temos de quantificar, se não ficaremos sempre aquém. “Gostava de ler mais”, quer dizer que amanhã se não marcar 30m ou 1h certa para ler, vou me esquecer ou haverá sempre algo à frente.
Depois, no meio disto tudo, o querer é importante, a paixão também, pois o que nos motiva, é mais fácil de ter disciplina, mas como o amor, tem de ser alimentado. Não é todos os dias que nos apetece “amar”. Há que ter rotinas e rituais, faz parte de tudo na vida.
Por fim, temos de nos perguntar: quais são as minhas prioridades na vida? No fim, o que quero ver para trás? Se na nossa vida a prioridade for amar a Deus, como no primeiro mandamento, o nosso tempo deve espelhar isso. Servir a Deus estará em primeiro e isso tem de ter uma concretização no tempo. Tal como escolho alguém na vida, dedico-lhe tempo naturalmente, o mesmo se passa com Deus. Que sentido faria dizer que queremos dedicar a nossa vida a ser trapezista e, em vez de passar o dia a treinar e a fazer espetáculos, passarmos o dia a ser advogado, por exemplo? Não faz sentido. O que escolho, despendo tempo, disponibilidade, entrega. Se me colocam outras escolhas, priorizo esta à frente. Se a seguir nas minhas prioridades, coloco a família, nas escolhas de tempo, também tenho a vida facilitada, se a seguir coloco o trabalho, depois o lazer, também já me facilita as escolhas na vida, pois a vida é feita de escassez e escolhas, como se diz em Economia. O tempo não é ilimitado. O que é limitado, temos de escolher. E o que quero acumular no céu? O que escolho fazer da minha vida? A mim cabe escolher.
Há tempo para tudo, se priorizarmos, nos organizarmos e soubermos dizer “não”. Não é isento de tensão e conflitos, mas depois não nos podemos espantar que nos tornamos no que passamos o tempo.
Por isso, aplicado ao dating, nós queremos encontrar alguém, mas o que fizemos de concreto para o alcançar? Em que prioridade está na minha vida? Se não está nas primeiras e se não é concretizado em tempo despendido por semana, não nos espantemos se chegarmos a mais velhos sozinhos. Onde estão essas pessoas que procuro? No datescatolicos, em eventos, com amigos, família? Estou nesses locais? Dedico tempo a essa procura? Quanto? Já coloquei na agenda quanto? Porque é que temos objetivos comerciais nos trabalhos e indicadores diários de performance e não os fazemos também na nossa vida? Se quero encontrar alguém na minha vida, quantos contactos fiz esta semana? Quando foi o último? Não é preciso ficar preocupado, mas se nada faço, nada vou receber como resultado. Em relação a mim, preparo-me, tento melhorar a minha aparência? Há algo na minha personalidade e defeitos que possa melhorar? Já reservei um tempo para fazer algo de que goste todos os dias? Em relação a Deus, se quero ter mais vida espiritual, o que fiz para a aumentar? Se estou insatisfeito com os meus hábitos, já procurei aconselhamento? Há algo que me incomoda a consciência, porque não me confesso e recomeço?
Pelo meio, pode até nem acontecer nada do que prevemos e lutámos, mas já construímos algo que não vai, de certeza, ser desperdiçado!
O ser humano é feito de várias dimensões, é feito para trabalhar, desfrutar, amar, não perca todas do projeto mais importante, nós próprios!
Força!
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